22 de julho de 2015

Da grande perda

A morte.
Essa grande filha da puta, sugadora da alegria, da esperança, da cor dos dias, das estações.
A morte.
Essa grande filha da puta que nos envolve e nos aperta, que nos desmonta e desconcerta, essa alarve que nos fixa num ponto negro parado, escuro, quando tudo à nossa volta gira, rodopia, ri, salta, vive e nós ali, presos na dor, na perplexidade de nós próprios quietos, cheio de braços que não abraçam, cheios de beijos que não beijam, cheios de amor sem objecto.
A perda total do objecto do amor e, ao mesmo tempo, do amor do objecto. A neurose e a psicose em confronto. O silêncio e o ruído. O amor e a fúria. O supremo da dor e a paraplegia do corpo.
A morte.
Essa grande filha da puta.
Hoje marejam-me os olhos por aquela mãe. Por aquele pai.
Hoje sou mãe com todas as minhas forças, hoje sou também aquela mãe e não quero ser, não quero ver, não sou capaz.
Sou incapaz.
Desculpem-me.
As palavras fundem-se no quente das lágrimas. As palavras são lágrimas.
As lágrimas são agora e para sempre, as minhas palavras.